O que vai acontecer aqui?

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O que vai acontecer aqui? Na Velha, no edifício ao lado, no outro e no outro a seguir, no largo da Senhora, na Velha SÉ e Se É que a cidade é pequena, na grande capital e no país?
Estou baralhado.
Fala-se em Património e na sua conservação. Procura-se portanto manter e conservar os Bens, qualidades, tradições, história, costumes e momentos felizes, para que se preserve o que há de mais Bonito (La Grande Bellezza) num lugar, para conhecermos a história e podermos avançar no tempo sabendo de onde viemos, e desta forma podermos fazer presente com um rumo e identidade.
Pois bem, a conservação que eu vejo está a matar essa identidade. E quem a mata?
– Obviamente o Dinheiro e os que o querem até à morte – privados, ignorantes, almas vazias, desesperados, e o governo claro, que é um pouco disto tudo.

O Património tem uma relação muito forte com um fenómeno bizarro que tem acontecido em Portugal: o Turismo.

O Turismo é o consumo do Património de um lugar desconhecido.
Mas ao contrário do que o Turismo diz, Património não são apenas velhas igrejas e tesouros de pó. Património também é aquilo que destroem e que podia ser visto antes de ser um albergue para Turistas (essas criaturas tresloucadas que andam de gabardine e calções, que passarão em tempos a ser o Turismo que eles próprios vêm ver, quando não houver mais nada), para no final, se poder ver o pó do tesouro e as igrejas velhas que vão sobrando dessa destruição.
Destroem a essência e pureza de um lugar criado por aqueles que nele fazem história e presente, para Turistas cá virem ver tal Grande Bellezza.
Os primeiros talvez ainda a consigam apanhar mas depois desses, os próximos Serão enganados por uns livros que guiam, escritos pelo Dinheiro, aqueles que mencionei: privados, ignorantes, almas vazias, desesperados, e o governo claro, que é um pouco disto tudo; pateta, de língua de fora a bater palmas como uma foca, que aprova tudo.
Esses livros que guiam, guiam Aos mealheiros da cidade. Não interessa se gosta ou se quer saber – o guia diz, é para fazer. (Acho que também é obrigatório tirar fotografias, pelo que vejo, e as selfies devem dar pontos.)

Prefiro andar do que estar parado. Estar parado não é bom.
– Agora, vamos andar bem pah!
Não podemos criticar a reforma contemporânea de um elemento patrimonial. O presente é diferente do passado, e colocar o tesouro numa vitrina para não apanhar pó não é solução. Devemos aceitar a reformulação dos Bens e a evolução das necessidades, mas procurando sempre preservar a essência do “objecto” e do seu contacto com o passado em todas as suas formas.

Destruir um cinema centenário numa cidade sem cinema, num período Media, não é
um passo para o presente nem para o futuro…
Prefiro andar do que estar parado, mas deveria englobar-se de alguma maneira esse Bem existente no programa necessário aos dias de hoje.

Destruir um estaleiro que fez crescer mais que uma geração numa cidade onde não havia mais nada, e que gerou pensamentos, discussões, ideias, movimentos, políticas, iniciativas, conhecimento e outros estaleiros como este, também não é um passo dar.
Se um cinema é Património e o queremos conservar, um centro que implantou raízes culturais numa cidade também o é. Não é preciso pináculos, frisos e padieiras emblemáticas de granito para o ser. São só escalas e períodos diferentes.

Estou baralhado.
A Velha-a-Branca fechou; ou pelo menos as portas ao público em geral, pois vai criando eventos esporádicos mas para um público específico; e fecha-se também a certas iniciativas propostas por pessoas com vontade de dar uma nova vida a este estaleiro.
Há uns meses, a Velha-a-Branca promoveu um concurso de ideias para arquitectos e estudantes de arquitectura, para a reabilitação do edifício onde se encontra e dos edifícios adjacentes, pois os seus proprietários pretendem criar apartamentos para alugar nestes quatro lotes.
O processo começou a andar, o que é bom, pois é melhor do que estar parado mas não foi com o melhor princípio – criar apartamentos para alugar num lugar que é já, na minha perspectiva, património da cidade de Braga.
Pois não é só com a preservação de uma fachada ou de uma caixa de escadas ou mesmo todo o núcleo construído e a configuração existente de um edifício que se valoriza o Património. O Património é muito mais do que isso. O Património é também La Grande Bellezza do lugar. Por vezes, acho mais importante a conservação de tal Bellezza do que uma fachada ou o recheio interior de um edifício – isso já dependerá dos objectivos e necessidades actuais, do estado dos materiais e estrutura, e claro, o valor patrimonial dos elementos encontrados e a sua relação com tais ponderações técnicas e programáticas.
No concurso, houve propostas que tiveram em consideração estes princípios e que preservaram o edifício da Velha-a-Branca, não só a nível formal, como procuraram manter através do desenho do espaço, o espírito cultural existente.
Passaram já alguns meses desde o anúncio dos premiados do concurso, podendo estes serem selecionados para a construção da obra ou não, mas até ao momento ainda não soube de nada do que vai acontecer aqui na Velha.

Vivo em Lisboa e algo se está a passar de muito errado nesta cidade.
Estão a destruir o Património Lisbonense quando acham que o estão a conservar, mantendo e limpando as fachadas dos edifícios, para a cidade ficar mais bonita, mas acabando com toda a vida que lá está dentro.
Destroem locais de culto de jovens e velhos, expulsam os velhos destruindo o bairrismo, repelem os jovens praticando rendas exuberantes, e a cidade começa a desaparecer, dando lugar a espaços de abrigo para os milhares de Turistas que entram e saem. E acham Eles que é um bom investimento para a cidade e o país… Para os bolsos deles talvez – dos tais privados, ignorantes, almas vazias, desesperados, e o governo claro, que é um pouco disto tudo.
E como será daqui a dez ou vinte anos quando o Turismo cair? A cidade fica deserta. E alguém escreve (…)“o teu nome em toda a parte: nas casas, nos carros, nas pontes, nas ruas. Em todo o lado essa palavra repetida ao expoente da loucura!”
E depois? Baixa-se as rendas? Em quê? Hotéis, T0`s, T1`s e Padarias Portuguesas?
Ou aqueles edifícios que outrora foram para uma só família e que agora se transformam em dispensas para dez, voltam-se a transformar naquilo que eram? É complicado – arquitectonicamente falando.
Como é? Braga também quer ser Lisboa?

O que vai acontecer aqui? é uma pergunta Que questiona não só o futuro mas também o passado e o presente da cidade.
Questiona o verdadeiro significado de Património e da sua conservação.
Questiona especificamente a importância e o valor patrimonial do estaleiro cultural Velha-a-Branca e o seu futuro, e a relação que este tem com o seu passado.

Questiona a diferença entre as velhas igrejas e o tesouro do pó da Velha que iniciou um processo que ficou parado no tempo e que pode morrer.