Festivais Gil Vicente: uma semana com três grandes directores nacionais

Ricardo III (Direitos Reservados)

Ricardo III (Direitos Reservados)

Não tem sido muito comum no teatro nacional que a crítica e o grande público estejam de acordo. Mas foi isso que aconteceu com “Ricardo III”, a encenação de Tónan Quito, estreada no final do ano passado no Teatro Nacional Dona Maria II, que abre, esta quinta-feira, mais uma edição dos Festivais Gil Vicente, em Guimarães. Na primeira semana da edição 2016 do certamente vimaranense há outras duas propostas de grandes directores do teatro contemporâneo nacional, para mostrar como esta arte está viva.

Comecemos por “Ricardo III”. Depois de ter sido bem acolhida pelos principais especialistas, na altura da sua estreia, a criação venceu, já este ano, dois galardões habitualmente atribuídos a propostas mais próximas do gosto popular. Primeiro foi Miguel Moreira a vencer o prémio de melhor actor atribuído pela Sociedade Portuguesa de Autores. Depois, foi o Globo de Ouro para melhor espetáculo de teatro. Esses serão certamente dois atractivos capazes de chamar um público mais alargado para a peça de abertura dos Festivais Gil Vicente.

Todavia, a proposta de Tónan Quito está longe de se aproximar de um gosto mais popular. Pelo contrário, a abordagem ao clássico de Shakespeare, escrito há mais de 400 anos, é radical. O espetáculo passa-se sobre um cenário de terra, assumindo a violência e a morte do texto original. Ali, as personagens vão caindo e sendo enterradas, abrindo o caminho do poder ao duque de Gloucester, que se tornará o monarca Ricardo III. A montagem assume contornos algo grotescos, a que a cenografia e a luz emprestam camadas extras de dramatismo.

Outro dos destaques deste espetáculo é o seu elenco. Além de Miguel Moreira, estão em palco o bailarino – e habitual colaborador de Moreira na Útero Teatro – e um conjunto de actores com percursos e registos bem distintos, como António Fonseca, Filipa Matta, Teresa Sobral ou Miguel Loureiro, que acabam por resultar como um todo.

“Ricardo III” sobe ao palco do Grande Auditório do Centro Cultural Vila Flor esta quinta-feira, às 21h30. Na primeira semana dos Festivais Gil Vicente há outros dois clássicos muitos modernos para ver. Na sexta-feira, na Black Box da Plataforma das Artes e da Criatividade (21h30), João Garcia Miguel apresenta “Ciclo Novas Bacantes”. Este espetáculo é composto por três solos criados a partir de “As Bacantes”, de Eurípides, interpretados por Sara Ribeiro, Frederico Barata e Rita Barbita. Garcia Miguel explora uma vez mais a relação entre o texto e o corpo, numa proposta de teatro performativo que se move por caminhos mais experimentais.

"O Misantropo" (Fotografia: João Tuna)

“O Misantropo” (Fotografia: João Tuna)

A fechar a primeira semana do festival de teatro de Guimarães, outro dos grandes directores de teatro nacionais da acutalidade, Nuno Cardoso, apresenta a sua mais recente criação – novamente no Grande Auditório do Centro Cultural Vila Flor (21h30). Depois de ter recebido o prémio da Sociedade Portuguesa de Autores para o melhor espetáculo de teatro do ano passado, com “Demónios”, o encenador beirão regressa a um texto clássico. Desta feita, o texto de que parte é “O Misantropo”, de Moliére, numa nova incursão pelo teatro francês, depois de “Britânico”, de Jean Racine.

Para trazer “O Misantropo” para os dias de hoje, Cardoso precisou de responder a uma pergunta. Que espaço ocuparia agora aquele que estava então reservado aos salões privados em que viviam as figuras escritas pelo dramaturgo francês? As happy hours, descobriu o encenador que assim decidiu meter o texto clássico numa discoteca, onde se ouvem Al Green, Marvin Gaye ou Frankie Valli.