Uma fronteira em Movimento

Um lugar vive da sua localização, da forma como se relaciona com os circuitos globalizados. Melgaço é um lugar de fronteira, um lugar de uma época, de uma história social, cultural e política. Melgaço é um território de liberdade: um território de passagem.

Com isto, interessa pensar que a travessia aconteceu e que muitos foram os que se despediram desta zona, pelo menos 11 meses por ano. Melgaço viu-se despir da sua estrutura habitacional, a emigração clandestina transformou este lugar. Isto serve para introduzir parte do porquê deste festival, Filmes do Homem. A arte, seja qual for a forma como opera perante um espectador, serve como inclusão e descrição do lugar onde se insere. Um filme pode resolver questões de época, pode ajudar na compreensão de um futuro mais próximo do passado. Quem fala do cinema fala da fotografia.

“FILMES DO HOMEM – Festival Internacional de Documentário de Melgaço, organizado pela Câmara Municipal de Melgaço e pela Associação AO NORTE, pretende promover e divulgar o cinema etnográfico e social, refletir com os filmes sobre identidade, memória e fronteira, e contribuir para um arquivo audiovisual sobre a região.”

FILMES DO HOMEM, é a centralização do que outrora se perdeu, é a construção de uma estrutura social e cultural de identificação, a soma de várias partes que incluem a noção de autor e espectador. Um lugar de confronto: saudável, vivo e actual. Estar em Melgaço de 2 a 7 de agosto é ser de Melgaço (não confundir saudade com saudosismo).

Depois de toda esta descrição de toque lacrimal, não fosse esta zona um marco para a história das famílias de todos nós, é importante perceber que isto que se está a descrever não é apenas, uma constante projecção de diversos filmes, com a simples intenção de criar programação. Repito, não é. Este festival, sendo realizado pela associação AO NORTE, tem uma estrutura que vai de encontro ao que é a sua orientação de trabalho, assim como a inscrição destas necessidades culturais num território como Melgaço.

Falar deste festival, é falar também de Jean Loup Passek. “No início da década de 1970”, Jean conheceu portugueses emigrados em França na rodagem de um documentário sobre a emigração. Podemos afirmar que foi aqui que nasceu o Museu do Cinema, foi aqui que ele conheceu a comunidade Melgacense. A partir daqui, Melgaço ganha uma relação estreita com a história do cinema, Melgaço constrói um museu com material cedido por Passek, um baú que inscreve e descreve a história do cinema. Cartazes, objectos, memórias: um museu do cinema.

Talvez tenha sido este o ponto de partida, o arranque para um raciocínio político de investimento, naquilo que é a construção cultural de uma zona geográfica válida do seu passado e do seu presente. Melgaço ganha uma relação directa com o cinema, os FILMES DO HOMEM assentam nesta procura, constroem uma programação que passa por diferentes abordagens e exclamações daquilo que é a arte como discurso, opinião e educação.

Não podendo aprofundar cada tópico do que é a programação exaustiva do festival, é importante perceber o que Melgaço oferece de 2 a 7 de Agosto. Desde os filmes a concurso, às exposições e trabalho de campo, na área do cinema e da fotografia, Melgaço é “ocupado” por um conjunto de críticos, observadores e criadores que despoletam uma nova visão sobre o território em causa. Expõe-se novas ideias e raciocínios e cria-se um conjunto de documentos que pretendem agir neste lugar como memória futura. Se a viagem é longa, até ao local em causa, maior será a viagem entre os frames e as palavras que inscrevem Melgaço como um território livre culturalmente.