O termómetro marca 37.5º. Isto pode ser o Couraíso, mas hoje está mesmo com ar de inferno. Não se estranha por isso que, a meio da tarde, bastem os dedos de duas mãos para contar as pessoas que se encontram na rua Conselheiro Miguel Dantas, a artéria principal de Paredes de Coura. Todavia, não é só o calor que explica o contraste entre esta imagem e a memória esplanadas cheias de gente e música em dias de festival. Numa localidade que não tem sequer 2000 habitantes, não se podem esperar horas de ponta.
Faltam dez dias para o início do festival e Paredes de Coura prepara-se para mais uma semana de enchente. Por uns dias, a população local multiplica-se por dez. “Já sabemos como é, nesta altura temos sempre que reforçar sotcks e fazer encomendas maiores”, conta Carlos Teixeira, dono do restaurante Miquelina. Não é o único comerciante a fazer as contas à vida, sabendo de antemão que vêm aí muitos consumidores de cerveja e bons garfos à procura “de pratos típicos, especialmente rojões e bacalhau”.
Entre os comerciantes de Paredes de Coura ninguém quer alongar-se muito sobre o peso que a semana do festival tem na sua facturação, mas, à boca pequena, comenta-se que o dinheiro ganho naqueles dias é suficiente para aguentar o negócio no resto do ano. O festival significa, porém, mais do que aqueles dias de vendas reforçadas, também há clientes que, diz Carlos Teixeira, “voltam durante o resto do ano”.
O primeiro sinal da proximidade do festival encontra-se no Xapa’s. Dentro do bar toca um dos discos de The tallest man on earth, que se estreou em Portugal em Paredes de Coura, em 2010, e agora regressa como um dos nomes em destaque no alinhamento deste ano. O cartaz da edição 2016 cobre também uma das portas envidraçadas do bar que, em 20 anos, acompanhou quase toda a história do evento. “Já tivemos anos bons e outros menos bons, mas o festival significa sempre mais movimento”, recorda o proprietário do estabelecimento, João Paulo Viana.
Duas décadas de história são também suficientes para que haja clientes habituais: “Alguns grupos de pessoas já vêm há tantos anos que às vezes parece que são courenses que estão fora e voltaram para o Verão”. Uma das marcas distintivas do festival Paredes de Coura é este sentimento de que, por mais que o festival cresça, continuamos sempre em família.
Um par de horas volvidas, na praia fluvial do Taboão, o director do Paredes de Coura, João Carvalho, repetirá por mais do que uma vez que este “é um festival de relações”. E pudemos confirmá-lo pela quantidade de vezes que foi sendo abordado por muita gente que o tratava pelo nome. Todos tinham alguma coisa para dizer, desde um comentário sobre a temperatura da água do rio a propostas de novos terrenos para o estacionamento dos festivaleiros. Carvalho responde-lhes a todos com a mesma atenção com que, em seguida, nos mostra as novidades que estão a ser preparadas para a edição deste ano.
O número de casas de banho duplicou e a maioria delas passou a ter ligação à rede de esgoto. Ao mesmo tempo, as casas de banho de homens e mulheres foram separadas, de modo a aumentar a privacidade dos utilizadores. O número de chuveiros também triplicou e há alguns “mimos” reservados como secadores de cabelo. “Quando se faz um festival há mais de 20 anos tentamos melhorar aquilo que tem sido bem feito ao longo dos anos”, defende Carvalho.
Uns metros ao lado, já há umas largas centenas de tendas montadas. Oficialmente, a área de campismo apenas abre no dia 12, a uma semana do início oficial do festival, mas quinze dias antes já havia quem viesse reservar lugar. Ângela, uma “cliente” habitual de Paredes de Coura soube da procura antecipada da zona de campismo e aproveitou o facto de viagem desde Guimarães, onde mora, ser curta para ir também marcar lugar.
“Normalmente costumava chegar no primeiro dia do Festival Sobe à Vila e montava tudo, mas comecei a ouvir dizer que já havia imensa gente a montar tenda e resolvi vir mais cedo”, explica. “Achava que já ia encontrar mesmo tudo cheio”, acrescenta. Acabou, porém, por ficar mais “aliviada” quando percebeu que aquele Domingo, a dez dias do início do festival era ainda tempo suficiente para encontrar “um bom spot”. Quando chegar de novo a Paredes de Coura esta sábado já sabe que tem um lugar à sombra.