A vida dura dois dias, o Alive durou três

Texto de Pedro Jesus

A organização do Optimus Alive 2013 gabava-se de ter o melhor cardápio para oferecer aos festivaleiros de aquém e além portas. A experiência prometia. Prometia desde logo porque angariava para cabeças de cartaz nomes do calibre dos Depeche Mode, tidos como a mais bem sucedida banda electrónica de todos os tempos, ou os Green Day, ainda em rescaldo após a edição da ambiciosa trilogia Uno!, Dos! e Tré!. Prometia igualmente porque convocava alguns dos nomes mais celebrados do último ano, os mesmos nomes que habitaram as listas consagradas a premiar os melhores discos, casos de Tame Impala (Lonerism foi o disco do ano para o britânico New Musical Express), Django Django (o álbum homónimo foi o disco do ano para a publicação portuguesa Blitz) ou dos Alt-J, vencedores do Mercury Prize de 2012 com An Awesome Wave. Prometia ainda pela quantidade de nomes que trazia a Portugal pela primeira vez e que distribuiu pelos três palcos. E precisamente porque os palcos eram três e porque o corpo é só um, ficam as impressões de quem andou a cirandar movido pela vontade de beber o mais possível destes três dias.

O primeiro dia

Logo à entrada somos brindados com o som das bandas que actuam no Pórtico e que, com a sua energia, suavizam o habitual aborrecimento que acompanha a espera para aceder à entrada num festival deste tipo.

Chego mesmo a tempo de assistir à entrada dos Two Door Cinema Club no palco principal. A banda mostra-se feliz com a recepção e desfila um alinhamento que pisca o olho ora ao indie-rock ora à dança. Já o vocalista Alex Timbre, impecável no seu smoking, não se coíbe de mostrar o alcance da sua voz e a omnipresença do seu falsete.

A seguir é tempo de rumar ao palco secundário onde já um número considerável de pessoas se juntaram para comungar do virtuosismo dos Dead Combo. Dança-se ao som de Lisboa Mulata e até o génio de Tom Waits é invocado por meio de uma versão de Temptation.

Findo o concerto, ninguém arreda pé porque já se prepara o palco para a estreia em solo nacional de Edward Sharpe & The Magnetic Zeros. E que estreia! Entre a postura sou-tímida-que-nem-um-rato da vocalista Jade Castrinos e a postura cool do líder Alex Ebert ninguém é poupado ante a actuação desta banda-irmandade, como lhe chama alguém ao meu lado. Canções como Home são entoadas por um público conhecedor que rendido dança de braços no ar. Uma belíssima surpresa.

Tempo ainda de ir a correr até aos restantes palcos e ver Jessie Ware no palco Clubbing numa actuação que parecia algo tépida, mercê talvez das explosões de riffs que os Green Day imprimiam no palco principal.

Os Vampire Weekend entram agora no palco secundário e o plano parece ser ter o público na mão desde o primeiro tema. A banda apresenta-se com Cousins e o delírio é imediato. Ao terceiro tema todos os corpos presentes se movem ao som de Cape Cod Kwassa Kwassa, um dos mais memoráveis temas do disco de estreia. O entusiasmo é tão contagiante que diria ser este o grande concerto do primeiro dia.

Edward Sharpe & The Magnetic Zeros

Edward Sharpe & The Magnetic Zeros

O segundo dia

A oferta era muita e variada mas tudo se tornou menos relevante perante o nome mais obrigatório deste segundo dia, Depeche Mode. A banda de David Gahan, Martin L. Gore e Andrew Fletcher entra em palco e a ovação é imediata. Têm o público na mão. Milhares de vozes cantam em uníssono. E Dave Gahan agradece mostrando que os anos não passam por ele. Os movimentos são compassados, lânguidos e provocantes. Ele está lá, está efectivamente lá, como se sentisse cada palavra que canta, não obstante as milhares de vezes que já o fez. Dave dança (e dança muito) e a espaços cede o protagonismo a Martin L. Gore, comovente na sua interpretação de Home. A surpresa está nesta emoção de ver uma banda que do alto dos seus trinta anos de carreira não soa datada, cansada, enfadada. Os temas entoados como se hinos se tratassem são mais que muitos: Policy of Truth, Enjoy the Silence, Just Can’t Get Enough, I Feel You ou Personal Jesus. Clássicos com nervo e urgência.

 

depeche_mode

Depeche Mode

O terceiro dia

Os Tame Impala estão no palco principal com os seus jogos de luzes psicadélicas a apelar a estados alterados de consciência mas a adesão do público presente nunca é realmente eufórica. A dada altura, o vocalista Kevin Parker anuncia que esta é a última data da digressão e o público como que acorda e presenteia-os com aquele calor tão típico dos portugueses.

De fugida espreito no palco Clubbing Optimus os minutos finais da estreia a solo de Blaya, dos Buraka Som Sistema, que na iminência de abandonar o palco proclama o amor pelo seu público e a desolação por ter de se retirar. Por ela ficava. Os presentes também não querem deixar ir.

À mesma hora no palco secundário apresentam-se os Of Monsters and Men e Little Talks é trauteado a plenos pulmões. Numa rápida transição, o palco é ocupado por Twin Shadow, o senhor que se veste a si e às suas canções com roupagens 80´s. George Lewis Jr., o frontman, é já uma presença habital no nosso país e sabe o que pedir e esperar dos portugueses. Os portugueses dão-lhe aquilo que ele quer: entusiasmo e devoção. George Lewis Jr. é um homem feliz.

Tempo de regressar ao palco principal e assistir à pop dançável dos Phoenix, que parecem surpresos com o quão bem-recebidos são pelo público. Mas quem tem realmente o público nas mãos são os Alt-J. Ou melhor, o público é que tem os Alt-J nas mãos, tal a quantidade de festivaleiros a reclamar a sua presença usando as mãos para desenhar um delta, o logo da banda. A enchente é total e não há nem um “espacinho livre” para dançar. Quem os está a ver sabe as letras de An Awesome Wave de uma ponta à outra. Ao mesmo tempo, no palco principal os Kings of Leon vão adiando Use Somebody e Sex On Fire o mais que podem e o público vai guardando a voz para os temas que melhor conhece. Já eu, rendido perante a reverência dada aos Alt-J, abandono o festival aconchegado e com a certeza a festa continuaria noite adentro nas canções encorpadas dos Django Django.

 

Segundo a organização, a mesma que prometia – e cumpriu – o melhor cartaz, passaram pelos três dias do festival 150 mil pessoas. Até 2014.

 

 

alt-j

Alt-J

 

Fotografias de Rúben Viegas