G.N.R. nos 30 anos de “Psicopátria”: velhos são os trapos

Créditos fotográficos © José Caldeira / TMP

Quando os G.N.R. lançam o disco Psicopátria, tanto a música portuguesa, como a própria banda, viviam um período de grandes transformações. Estávamos em 1986, o mesmo ano em que os Mão Morta venciam o prémio de originalidade no concurso de música moderna portuguesa, do Rock Rendez-Vous. Para melhor nos situarmos, aquele local de concertos de Lisboa abrira em 1980 e o jornal Blitz era lançado em 1984. Após o chamado boom do rock, Portugal fervilhava e reagia com uma mudança direcção, no que à música diz respeito, mas não só.

As bandas não queriam ser rock, porque era foleiro ser uma banda de rock e daí ter-se-á criado uma nova etiqueta, para evitar a tal catalogação, que tinha posto o país aos saltos – surge então a música moderna portuguesa. Deste movimento de reacção ao rock, surgem bandas como a Sétima Legião, Mler If Dada ou os Pop Del’Arte e editoras como a Ama Romanta e a Fundação Atlântica. Seriam estes os tempos dos pós-modernos.

Apesar de os G.N.R. terem surgido no início da década e terem lançado um primeiro single, que se encaixava nos cânones então vigentes, rapidamente se afastaram da trajectória dos singles orelhudos para passar na rádio, com dois álbuns marcadamente experimentais e de certa forma inovadores – Independança (1982) e Defeitos Especiais (1984). “Dunas” do álbum Os Homens Não Se Querem Bonitos, de 1985, que hoje é descrito pela banda como um acidente, marcou a mudança estética dos do Norte para uma pop refinada, mantendo um estilo non-sense das letras e da postura arty. Essa mudança ditou o progressivo afastamento de Alexandre Soares e chegamos então a Psicopátria, saído em Março de 1986.

Passaram-se trinta anos e o disco ganhou uma espécie de aura, que se foi acentuando com o tempo. Aos olhos de hoje o disco consegue ser moderno (muitos dos temas que se depreendem das letras de Reininho, mantêm-se actuais) e acessível – coisa que contemporâneos não conseguiram, como os Mler If Dada ou os Pop Del’Arte, motivo de um culto muito próprio que se mantém até aos dias de hoje e que é diferente daquele que é dedicado aos G.N.R..

Para assinalar a data, a banda reaprendeu a tocar os velhos temas de 1986 e apresentou-os ao vivo, num concerto no Teatro Rivoli, na sua cidade – o Porto. A sala encheu e cantou alto as músicas que tornaram o disco popular. Se, quando o disco saiu, quem o ouviu até à exaustão estaria na sua adolescência, hoje esses estarão na casa dos 45-50 anos. Compreende-se, portanto, que no Rivoli estivesse lotado com casais acompanhados pelos filhos. Não se pense que isto tornou a celebração mais triste, porque era de alegria o ambiente que se sentia no Rivoli, como se, de repente, trinta anos não tivessem passado. Houve quem se atrevesse a uns passinhos de dança, para desespero das assistentes de sala e houve quem mandasse uns piropos a Rui Reininho, desconhecendo que tal não é permitido.

Os G.N.R. não se ensaiaram muito e começaram pelo fim com o mecânico “Miss You”, que encerra Psicopátria. Depois, atacam com “Pós-Modernos” e terminando com “Choque-Frontal”, a banda percorreu o alinhamento integral do disco. Alguns dos temas foram tocados pela primeira vez ao vivo, como é o caso de “O Paciente”, “Coimbra B” e “Cerimónias”. A falta de prática não evitou um prego ou outro, que foram sempre levados com a disposição de quem abre um vintage. Por outro lado, naturalmente, notou-se a desenvoltura dos temas que passaram a ser presença constante nos alinhamentos da banda, que teve Paulo Borges nas teclas e Samuel Palitos na bateria.

Num concerto deste género, em que se sabe à partida o alinhamento, não há que criar grandes expectativas, tirando talvez a experiência de ouvir alguns temas tocados ao vivo. Não houve surpresas, para o bem e para o mal – havia um vídeo preparado, que talvez fosse o complemento ideal para quem estava à espera de uma sereia no topo do bolo. Mas algo não funcionou e as músicas foram suficientemente competentes a preencher o espaço que havia para preencher. É suposto que o envelhecimento contribua para uma maior eficácia das coisas e, nesta ocasião, assim foi.

Créditos fotográficos © José Caldeira / TMP