Um método perigoso, de David Cronenberg (2)

O que escrevi num post anterior sobre este filme não era perfeitamente correto. Afinal, a promessa da vinda de um ator ou alguém “importante” era para a antestreia de um filme “surpresa” que está agendado para o final deste mês. Houve a feliz coincidência de  ser hoje o aniversário do Cineclube, com direito a bolo e a espumante. Mas como diria Jung, não há coincidências. O filme é competente na sua função de contar uma história, e o tema é cronenberguiano o suficiente, não tanto no estilo quanto nas obsessões pelas perturbações interiores das personagens.

A presença de Michael Fassbender num filme com uma óbvia relação temática ao filme “Shame” que tem tido algum destaque no “Ócio”, é outra não coincidência a analisar por quem se interesse pelos fenómenos da consciência coletiva. Haverá no ar a urgência de um novo confronto das pessoas com os tabus e repressões, numa altura em que a Sida parece deixar de determinar a forma como as pessoas se relacionam em termos sexuais? A liberdade sexual dos anos 60 está a dar lugar a um fenómeno diferente, mais científico e racional, em contraste com a liberdade mística catalizada pelas drogas e pela arte psicadélica?

Repegar em Freud e Jung numa altura em que já ninguém os utiliza como referentes obsessivamente utilizados na arte – já lá vai o tempo em que um objecto cilíndrico era sempre a representação do falo, e quem o dissesse passava por ser muito culto – é também assumir uma forma desencantada, mas não menos misteriosa e fascinante de viver a sexualidade. Por isso, este filme, não sendo um filme virtuosístico de Cronenberg, é um filme certo na altura certa, e que reequaciona a herança daqueles que incluíram o mistério dos impulsos e instintos inerentes ao ser humano nos dilemas de quem quer ser livre, feliz, ou os dois.